SANCLERLÂNDIA
Prefeitura abre Jeep Cross e fecha hospital
Sem atendimento médico, mulher ganha bebê na frente do Hospital Municipal. Caso revela o caos que a população enfrenta na saúde do município
André Luiz Gomes
A população de Sanclerlândia está indignada com um escândalo ocorrido paralelamente às festividades do Jeep Cross. A dona de casa, Nilva Batista Siqueira Martins, de 20 anos, deu à luz na porta do Hospital Municipal, que no momento estava de portas fechadas, sem nenhuma assistência profissional. Não fosse a ajuda de moradores vizinhos, que a colocaram numa grama em frente à unidade, o final poderia ter sido trágico.
O caso despertou a ira das pessoas que presenciaram a cena. Mesmo sendo o único hospital do município, o Hospital Municipal São Vicente de Paulo, segundo moradores, esteve fechado durante a festa. Em função da festa, o número de pessoas na cidade aumentou muito. Motivo há mais para que a saúde municipal ficasse mais alerta.Nilva, que mora próximo ao hospital, conta que não esperava que o parto iria acontecer naquela noite. Segundo ela, o marido, Eder José de Oliveira, 22, havia ido passar a noite na casa da mãe, duas quadras abaixo. Percebendo as contrações, ela foi atrás do marido. O casal e familiares foram ao hospital, e por volta de meia-noite daquela sexta-feira, o marido, pediu insistentemente que a atendente abrisse o hospital e providenciasse o atendimento. Eder afirma, que o atendente teria dito que o caso da sua esposa não era urgente – sendo que menos de 40 minutos, ela depois deu a luz – e que o médico fica nervoso quando é chamado.
Depois da recusa do atendimento, o casal Vilmar e Luciene, que mora em frente ao hospital, foi chamado por parentes e prestou socorro à gestante. Depois de leva-la para a sua residência, o casal emprestou sua cama para que os procedimentos do parto fossem realizados. Eder, o pai, foi obrigado a assumir a situação e fez, com as próprias mãos, o parto do filho. Com o nascimento, o problema ainda não estava resolvido. O marido foi novamente ao hospital pedir atendimento para a esposa que acabara de dar a luz. Não conseguindo, num momento de desespero, ele chutou a porta, quebrando um vidro. Segundo ele, a atendente do hospital chamou a Polícia Militar para prende-lo. Instantes depois, os policiais chegaram ao local e, diante da situação, teriam dado razão ao casal e fizeram abrir o hospital. Os próprios policiais carregaram Nilva, em uma maca, para dentro do hospital. O médico José Leôncio foi chamado e, ao chegar, disse ao pai da criança que não poderia cortar o umbigo do recém-nascido porque não haviam instrumentos. A vizinha, Luciene, se prontificou a buscar uma faca em sua casa. Não foi preciso, o médico fez o corte e encaminhou a mãe e o bebê, para um hospital de Mossâmedes.
O presidente do Conselho Municipal de Saúde, de Sanclerlândia, Wilson Rodrigues de Almeida, disse que Eder e Nilma solicitaram ajuda ao Conselho, que desde então tem acompanhado o caso. Wilson disse que o fato de ter acontecido justo quando a cidade estava envolvida na festa mostra o quanto é grave a situação e a negligência da administração municipal. “Não é que somos contra festa, pode fazer a festa, mas é preciso dar conta da saúde primeiro”, afirmou.
Wilson disse também que a saúde no município está em situação de abandono pelo poder público municipal. “O fato é que o hospital não estava aberto. Nossa cidade está sem nenhum hospital. Estamos abandonados”, denuncia. Wilson disse ainda que o Conselho tem acompanhado as ações do poder público, sugerindo soluções, mas não são acatadas. Segundo ele, o Conselho sugeriu que o município alugasse o Hospital Santa Lúcia (fechado recentemente) enquanto se fazia reforma no Hospital Municipal. O que não aconteceu.
O secretário Municipal de Saúde do município, que administra o Hospital Municipal, Valdivino Mendonça Silva, disse que o casal não foi atendido porque a gestante não foi em momento algum na porta do hospital pedir atendimento. Segundo ele, se a gestante estivesse lá, o médico seria chamado e ela seria atendida. O secretário disse que não estava lá, mas foi dito que Eder estava alterado e por isso chutou a porta do hospital, quebrando um vidro.
Valdivino disse também que o hospital está em reforma e não tem condições de realizar nenhum tipo de cirurgia, nem mesmo um parto. No caso da dona de casa, Nilva, ele fala que se ela mesma tivesse pedido ajuda, ela teria sido levada para um hospital numa cidade vizinha, que geralmente é Firminópolis, Mossâmedes ou Goiânia. Nilva e o marido afirmam que estiveram no hospital e que ela ficou sentada numa grama próxima à porta de entrada.Segundo o secretário, Sanclerlândia conta com médico plantonista 24 horas por dia. Esse médico fica na casa dele, que é atrás do hospital, e quando há uma emergência, ele é chamado. Ele afirmou ainda que durante o Jeep Cross não foi feito nenhum preparativo que difere dos outros dias, estando um médico de plantão, mesmo que em sua residência.
O casal Eder e Nilva classificou de negligência criminosa a forma pela qual foi atendido e vai acionar a justiça contra o hospital. Eles contam com o respaldo do Conselho Municipal de Saúde e que já consultaram o Ministério Público da comarca.
Outro caso que aconteceu no Hospital Municipal São Vicente de Paulo envolveu Daiany Daniel da Silva, 25. De acordo com Daiany, ela estava com pneumonia e com uma febre muito alta. Por volta das 9 horas daquele dia, o marido a levou até o hospital, mas ela não foi sequer examinada. Então ela teve que se deslocar até o município vizinho de Mossâmedes para receber atendimento médico.